A reforma que não houve

26/12/2012 19:41

Por Homero de Oliveira Costa, prof. do  Departamento de Ciências Sociais UFRN

O tema da reforma política tem frequentado os discursos de muitos parlamentares do Congresso Nacional  e até mesmo da presidente Dilma Rousseff. Na posse em janeiro 2011, a presidente a defendeu como uma das prioridades do seu governo e assim o fez em discursos posteriores em 2011 e 2012. Mas o fato é que, mesmo com as intenções da presidente e de alguns parlamentares, mais um ano se passou e nada de se votar (e aprovar) a tão esperada reforma política.

Por que a reforma política não é votada no Congresso Nacional? Creio que em parte  tem sido em função da incapacidade dos governos (deste e dos anteriores) em articular os partidos da base governista no Congresso em torno de alguns pontos consensuais. Hoje, os principais partidos da base aliada, o PT e PMDB, discordam em questões centrais como, por exemplo,  financiamento público exclusivo de campanhas eleitorais e voto em listas fechadas. Mas há outros temas também relevantes sobre os quais também não tem havido consenso, como o fim das coligações para as eleições de deputados e vereadores; eleições unificadas a cada quatro anos; cláusula de barreira; voto facultativo, criação de federações partidárias; candidatura avulsa; reeleição e suplência de senadores.  Esses são apenas alguns dos complexos  temas que envolvem mudanças no sistema político. O problema, ao longo dos últimos dezoito anos, tem sido como aprovar essas propostas no Congresso Nacional, algo que a presidente Dilma Rousseff, como toda sua legitimidade e apoio popular  não conseguiu fazer com que o Congresso votasse nos dois primeiros anos de governo, assim como também não conseguiram Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva em seus dois mandatos, mesmo com maioria nas Duas Casas legislativas. Em síntese, tem havido muitas conversas e pouca ação.

O que a experiência acumulada nesses anos revela é que o único caminho possível para uma ampla reforma no sistema político brasileiro é a ampliação do debate público, o fortalecimento da inciativa popular, com a participação de organizações da sociedade civil (como a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, o Movimento de Combate a Corrupção Eleitoral etc.), pois se depender apenas do Congresso Nacional, dificilmente haverá uma reforma política (pelo menos que contemple o conjunto de temas que têm sido discutidos), e por uma razão simples: a presença considerável no Congresso Nacional dos que se beneficiam com o sistema político atual, e isso inclui tanto a chamada base aliada do governo, como a oposição.  Como disse o Deputado Federal Chico Alencar (PSOL/RJ), dentro do Congresso, a reforma política tem adquirido a “consistência fugidia dos fantasmas”. Para ele “no discurso, na retórica, o tema não sai da pauta. Todos se dizem a favor. Mas sempre que se aproxima da pauta efetiva de votação, o fantasma desaparece. Empurrando para frente, ele sempre retornará a cada nova conjuntura”. E complementa “na maioria da representação parlamentar, quem reúne forças para patrocinar a mudança, uma força adquirida por intermédio das regras em curso, não tem interesse em mudar. E quem tem interesse em mudar, não reúne forças”.

Entre os temas relevantes de uma ampla reforma política certamente está o do financiamento de campanhas eleitorais.  A proposta de financiamento público exclusivo tem sido defendida não apenas pela presidenta Dilma Rousseff, como pelo PT e alguns partidos da base aliada (como o PC do B) e aprovada em todas as comissões especiais de reforma política do Congresso desde 1995, no entanto, não tem ido além das intenções. É um tema relevante porque é decisivo em eleições. O deputado Henrique Fontana (PT/RS) relator da comissão de reforma política da Câmara dos Deputados defende o financiamento público exclusivo porque, segundo ele, o financiamento privado tem sido uma das maiores causas da corrupção no país, ou seja, “o fato de que aqueles que fazem negócios com setor público serem os mesmos que são procurados para financiar as campanhas, então essa mistura não tem dado certo”.

Em termos de gastos públicos, segundo os dados disponibilizados pelo Tribunal Superior Eleitoral, as eleições municipais de 2012 foram as mais caras da história do país.  Para as eleições de outubro de 2012, a dotação orçamentária foi de R$ 597 milhões, enquanto nas eleições de 2010 foram R$ 480 milhões, já em termos de recursos tanto públicos (Fundo Partidário) como privados,  a soma dos gastos declarados de todos os candidatos a prefeitos de 2012, de acordo com dados do TJSE, considerando apenas as capitais, foi de aproximadamente R$ 1,25 bilhão, bem acima dos dados oficiais relativos às eleições para governador de 2010, na qual, os gastos declarados pelos candidatos dos 26 estados e do Distrito Federal somaram R$ 735 milhões.

Quanto ao financiamento privado de campanhas, o deputado Chico Alencar disse que o julgamento  no Supremo Tribunal Federal da Ação Penal 470 (conhecido como processo do “mensalão”) assim como as investigações sobre as relações entre Carlinhos Cachoeira com políticos e empresários, evidenciaram, nos dois casos, que “a raiz está no envolvimento de poderosos grupos empresariais na política e no financiamento de campanhas”. Para o deputado “em todos os grandes escândalos das últimas décadas, se o cidadão puxar o fio da meada vai chegar ao mesmo ponto: grandes corporações, tesoureiros de campanhas, obras superfaturadas. O formato atual de financiamento de campanha eleitoral é um fator incontrolável de corrupção”.

Mas não basta simplesmente aprovar o financiamento público exclusivo, é necessário saber quais os valores e limites, o controle por parte dos partidos e da justiça eleitoral etc, como diz Marcio Nuno Rabat,  consultor Legislativo da Câmara dos Deputados no artigo “Reforma política no Congresso Nacional: Histórico e situação atual”(2010) “Duas dificuldades merecem ser destacadas na regulamentação do financiamento público exclusivo de campanhas. Em primeiro lugar, é difícil estabelecer o total de recursos adequado para todos e cada um dos partidos façam suas campanhas em todos os municípios do país. Em segundo lugar, é preciso decidir se se deixa a critério dos partidos a distribuição dos recursos entre vários pleitos de que participam ou se alguns critérios devem ser estabelecidos em lei” 

Em relação a perspectiva de aprovação de uma reforma política no Congresso Nacional (que terá o financiamento público exclusivo de campanhas como um dos seus componentes necessários), com a sua inoperância, o entendimento de organizações da sociedade civil, como a Plataforma dos Movimentos pela Reforma do Sistema Político é a de que, sem participação popular não haverá reforma,  daí a iniciativa de coletar assinaturas para apresentar um projeto de lei de iniciativa popular, como primeiro passo nesse sentido. O Movimento disponibiliza vídeos e uma cartilha (“Para mudar: Reforma Política Já!) e um conjunto abrangente de propostas que, se chegarem ao Congresso, amparadas, como  à Lei da Ficha Limpa, numa ampla mobilização popular, aumentam as chances do congresso votar a reforma política, caso contrário, continuarão apenas as intenções e os discursos.

 

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