Reforma política: listas fechadas ou abertas?

19/03/2011 22:23

Por *Homero de Oliveira Costa

Existem basicamente dois tipos de sistemas eleitorais: o proporcional e o majoritário, com grandes variações entre eles. A distinção baseia-se em dois aspectos: os sistemas majoritários têm por objetivo o de garantir a eleição dos candidatos com maior votação em determinado distrito e o proporcional tem por objetivo garantir, através das urnas, a representação de todas as correntes de opinião na sociedade.


Não há consenso entre os estudiosos dos sistemas eleitorais em relação a qual o sistema ideal. Qual o mais democrático? Há países democráticos com sistema majoritário (ex. Estados Unidos, França, Austrália, Canadá e Inglaterra) e há países democráticos com sistemas proporcionais (Áustria, Bélgica, Grécia, Holanda, Suécia e Suíça), todos com muitas diferenças entre si. Exemplo: Alemanha e Itália usam um sistema misto, a Dinamarca, Suécia, Bélgica e Holanda, o proporcional de lista fechada.

No caso do sistema proporcional, há os de listas abertas, o de listas fechadas, (Israel, Argentina, Portugal, Espanha, Uruguai e África do Sul, por exemplo) listas flexíveis (Áustria, Bélgica, Grécia, Holanda e Noruega, entre outros) e o de lista livre (Suíça), cada um com grandes variações, ou seja, são vários os procedimentos adotados quanto à escolha de candidatos pelos eleitores.

No Brasil, desde a Constituição de l934, está em vigor o sistema proporcional de listas abertas, que é aquele em que os partidos apresentam uma lista de candidatos e o eleitor vota em candidatos de sua preferência (No entanto com a permissão das coligações, pode-se votar num candidato de um partido e ajudar a eleger outro candidato, de outro partido).

Há pouco, na discussão a respeito da reforma política - adiada mais uma vez - chegou-se a cogitar a aprovação de duas medidas que teriam impacto significativo no processo eleitoral: o financiamento público de campanha e a mudança do sistema proporcional, de listas abertas para o de listas fechadas - ou seja, o eleitor votaria numa lista partidária, aprovada em convenções (se um partido tiver voto suficiente para eleger, digamos 10 deputados, seriam os 10 primeiros da lista).

São poucos os países no mundo que adotam o sistema de listas abertas. Além do Brasil, apenas Finlândia, Peru, Polônia e Chile, adotam esse sistema mesmo assim, com diferenças substanciais entre si. Por exemplo: no Chile, o sistema proporcional de listas abertas, que foi aprovado na reforma eleitoral de l989, é um sistema chamado de binomial, ou seja, o país é dividido em distritos eleitorais e cada distrito elege dois representantes para a Câmara dos Deputados e dois para o Senado (cada partido ou coligação apresenta dois nomes, e o eleitor vota em apenas um). Para um partido eleger os dois representantes de cada distrito, é necessário obter mais do dobro da votação do segundo partido (ou coligação) mais votado. Caso isso não ocorra, a segunda vaga é do partido (ou coligação) que obteve a segunda maior votação.

Portanto, mesmo sendo um sistema proporcional de listas abertas, o processo de escolha dos representantes para os respectivos congressos, é muito diferente.

O sistema eleitoral de listas abertas, especialmente o adotado no Brasil, tem sido objeto de muitas críticas. Uma delas é a grande autonomia dos eleitos em relação aos partidos, a individualização das campanhas eleitorais, levando uma disputa para dentro dos próprios partidos (não apenas em relação aos votos, como também da arrecadação de recursos), e eleva os custos das campanhas, facilitando o uso do chamado caixa 2.

Além dos citados, creio que um dos aspectos importantes é o fato de tornar a disputa dentro dos próprios partidos, muito desiguais. Só para citar um exemplo, entre muitos que poderiam ser dados: nas eleições de 2006 no Rio Grande do Norte, por exemplo, houve candidato a deputado federal que apresentou junto ao Tribunal Regional Eleitoral, comprovantes de gastos em torno de R$ 950.000,00 (arrecadados junto a pessoas físicas e jurídicas) enquanto outro candidato, do mesmo partido, apresentou uma receita no valor de R$ 3.500,00. A questão é: quais as chances deste último na disputa eleitoral? As diferenças se repetiram em todos os partidos (não necessariamente na mesma proporção), refletindo a individualização das campanhas.

Assim, se o que se deseja é o fortalecimento dos partidos e possibilitar a todos a igualdade na disputa eleitoral, o sistema de listas fechadas é o mais indicado e, desde pelo menos l995, tem sido proposto por todos os relatórios das comissões sobre reforma política formadas no Congresso Nacional e nunca foi aprovada. Certamente aqueles parlamentares que são financiados por empresas (Indústria, Comércio, etc.), empreiteiras, bancos etc. (e mesmo pessoas físicas) não vão querer mudar este sistema.

Há restrições a ele? Há. Um deles diz respeito ao fato de que dará grande poder às cúpulas partidárias, que organizariam as listas nas convenções. Mas isso já não acontece no atual sistema? Por acaso não são os "caciques" de cada legenda que decide, em última instância, quem vai compor a lista de cada partido?

A lista fechada, a meu ver, possibilitaria uma maior identificação do eleitor com o partido e representaria um avanço no sentido de tornar a disputa eleitoral mais democrática (associada ao financiamento público de campanhas e a democratização das Convenções Partidárias) e contribuiria para o fortalecimento dos partidos políticos.

*Homero de Oliveira Costa é professor da UFRN

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