Os Dilemas do Fisiologismo

14/07/2011 20:52

Por Homero de Oliveira Costa, prof. de ciência política da UFRN.

Nos primeiros seis meses o governo de Dilma Rousseff tem tido junto à opinião pública índices de satisfação expressivos, no entanto, apesar disso e de um amplo apoio no Congresso, tem enfrentado problemas, especialmente com a base aliada. Foi assim no caso da demissão do chefe da Casa Civil Antonio Palocci e no mais recente, o escândalo no Ministério dos Transportes, com a demissão do Ministro Alfredo Nascimento. Além disso, o governo foi derrotado numa votação importante na Câmara dos Deputados: a da emenda 164 do Código Florestal (273 votos contra 182). Pouco antes da votação, o então líder do governo, deputado Cândido  Vacarezza (PT-SP) tinha orientado a base aliada a rejeitar a proposta e afirmou que a presidente Dilma Rousseff  tinha lhe pedido para revelar no Plenário que ela considerava a emenda “uma vergonha”. Mesmo assim, foi derrotada.

A questão é: se a base aliada é fundamental para o que se chama de governabilidade, ela é garantia suficiente para isso? Ao que tudo indica, não. Especialmente com a base aliada  que esse governo tem: se por um lado é a maior  desde o fim da ditadura militar (1985), ao mesmo tempo, por não ser constituída com programas e projetos consistentes para o país, mas na base do fisiologismo (entendida aqui nos termos do dicionário Houaiss da Língua Portuguesa como “conduta ou prática de certos representantes e servidores públicos que visa à satisfação de interesses ou vantagens pessoais ou partidárias, em detrimento do bem comum”) não tem consistência e a solidez necessária para dar garantia de governabilidade. O caso recente do Partido da República é sintomático: a exemplo da maioria dos partidos que formam a base do governo, não tem programa (a não ser o formal, apresentado à Justiça Eleitoral), ideologia e certamente apoiaria qualquer outro governo, desde que tivesse as benesses que são oferecidas para se ter apoio no parlamento. 

O fisiologismo não é certamente só desse governo. Para ficar nos exemplos mais recentes, os de Fernando Henrique Cardoso e de Luis Inácio Lula da Silva, também não foram constituídas com base em  programas comuns, em torno de idéias, projetos etc., mas da troca de favores, cargos e liberação de verbas. Só que tanto Fernando Henrique quanto Lula, se articularam com suas bases, fazendo todo tipo de concessões. Já Dilma Rousseff tem tido mais dificuldades porque, ao que tudo indica, tenta administrar o país sem fazer demasiadas concessões à chamada base aliada. São exemplos a indicação do engenheiro Flávio Decat para dirigir Furnas (a despeito das pressões do PMDB para mantê-la  sob sua tutela) e a indicação recente do substituto do Ministro dos Transportes, sem ouvir o partido do então ministro (PR). Mas, ao fazer isso, o governo passa a enfrentar problemas. Afinal, o PR tem 40 deputados e 7 senadores e é um dos partidos importantes na base de apoio no Congresso Nacional (embora, sem ele, ainda mantenha folgada maioria no Parlamento). O problema é que a insatisfação não é apenas do PR, mas da maioria dos partidos que compõe a base e a derrota do governo na votação especialmente da Emenda 164 do Código Florestal mostrou como essa base não é confiável. E quer cargos. Segundo Josias de Souza (Folha de S. Paulo, 18/06//2011) “Constatou que, hoje, algo como 75% das poltronas de segundo e terceiro escalão estão ocupadas por apadrinhados do PT. Uma realidade que Dilma herdou de Lula. Para tender aos pedidos dos outros 13 partidos aliados, o Planalto terá de mandar petistas ao olho da rua”. A base aliada está insatisfeita: ela quer não apenas a liberação de verbas das emendas de seus parlamentares, como cargos. Se não ocorrer, a própria base aliada já preparou o que se chamou de “agenda de retaliação” que é a ameaça de aprovação de duas emendas que terão um impacto de algo em torno de 55 bilhões nos cofres públicos, que são a Emenda 29 e a de n. 300. A 29 é a que regulamenta gastos com a saúde e a PEC 300 estabelece um piso salarial nacional para policiais militares e bombeiros (em torno de 700 mil no país) que deverão ser equiparados ao da policia militar do Distrito Federal (que são os maiores salários do Brasil). O governo é contra. E o dilema é: ou atende a base aliada ou será derrotado novamente no plenário da Câmara dos Deputados. São, portanto, parte dos dilemas do fisiologismo...

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