Governos europeus vão resgatar bancos com dinheiro público
DIANA CURADO, DE CONGONHAS (MG)
O título acima poderia ser de qualquer jornal de outubro ou novembro de 2008. Mas não, titulos assim têm aparecido em vários jornais deste mês de outubro de 2011. Passados três anos dos governos terem gasto bilhões de euros dos impostos dos trabalhadores europeus para salvar bancos recheados de capitais fictícios derivados dos créditos sub-prime, eis que agora resolvem repetir a proeza, para salvar bancos recheados de bônus de divida pública de países em dificuldades, como a Grécia.
Como tudo começou
Setembro de 2008, quando explode a crise do sub-prime, milhares de ativos bolsistas derivados do crédito de alto-risco começam a desvalorizar-se rapidamente transformando-se no que já eram na verdade: papéis sem qualquer alicerce na realidade, sem nenhum valor. O Lehman Brothers vai à falência, segue-se o Fannie Mae & Freddie Mac. Nesse momento os EUA decidem recapitalizar a banca com biliões de dólares do FED, comprando os milhares de ativos tóxicos derivados do sub-prime.
Quando os bancos europeus também altamente contaminados pelo mesmo vírus, o sub-prime, começam a ir à falência, os governantes da União Europeia (UE) vêem que têm que seguir os passos americanos. E eis que o calcanhar de aquiles da UE se mostra, enquanto os EUA são um único país com um único governo, a UE é um bloco de países imperialistas, cada um com seus próprios interesses e seu próprio Estado.
Também ficou claro “quem manda” na UE, em especial na zona do Euro, desde o início que França e Alemanha têm ditado as respostas à crise económica. E se desde o início Sarkozy tem defendido uma maior integração europeia, inclusive com a criação de um fundo monetário europeu. Também desde o inicio Angela Merkel tem fugido a essa maior integração. A razão é simples, a Alemanha continua a ser o país em melhor situação económica. Logo, uma maior integração significa também maior exposição da burguesia alemã à crise.
Assim em 2008 a crise bancária foi resolvida a nível nacional, cada Estado injetou dinheiro dos seus trabalhadores nos bancos da sua burguesia. E se para os imperialismos mais fortes isso não constituiu um problema maior, para países como Portugal, Irlanda e Grécia com uma economia fortemente baseada nos serviços, no turismo (em especial Grécia e Portugal) e nos setores industriais de baixa especialização (textêis, calçado e industria alimentar) essa injeção de capital associada à crise (que fez cair os lucros desses setores) foi um duro golpe. A Grécia fortemente endividada foi a primeira economia a cair, sendo mais tarde seguida por Irlanda e Portugal.
Da espiral da divida pública ao retorno à divida privada
Os Estados endividaram-se para salvar a banca mas quando os mesmos Estados tinham que ser salvos a fatura foi cobrada aos trabalhadores. As draconianas medidas de austeridade são amplamente conhecidas, têm sido um dos maiores ataques de sempre aos direitos dos trabalhadores associados a uma destruição em larga escala do estado social. Só que longe de debelar a crise estas medidas têm gerado recessão económica, nos países afetados, e tornado a dívida cada vez mais impossível de pagar.
Em julho deste ano a Grécia anunciou que não tinha dinheiro para pagar as dívidas que venciam nesse mês. A perspectiva de um default grego gerou pânico nos mercados e desta vez as dúvidas afetaram não só as economias portuguesa e irlandesa mas também a do estado espanhol e pela primeira vez de Itália. Nem a criação do fundo de resgate europeu em julho pode impedir a nova onda de pânico nos mercados. Nem todo o dinheiro n fundo não seriam suficientes no caso da Itália ou a Espanha necessitarem do dinheiro.
Mas outro iceberg foi avistado, o que acontecerá aos detentores de títulos de dívida grega? Há cerca de um ano os grandes bancos europeus, prevendo um default grego, começaram a tentar desfazer-se rapidamente dos títulos de dívida grega e de outros países em dificuldades, vendendo-os no mercado secundário. O Deutsche Bank reduziu em cerca de 70% a sua exposição à divida emitida por Espanha, Portugal, Irlanda e Itália.
Mas se o Deutsche Bank teve algum sucesso nesta operação, o mesmo não se pode dizer de outros bancos. Dado que há cada vez mais duvidas de que estes países paguem as dividas os títulos são comprados nos mercados secundários por vezes a 40-60% a menos do valor inicialmente estabelecido – um título que valesse, por exemplo, 1000 euros passou a ser comprado por 400 euros.
Isto não significa que os bancos andaram a perder milhões ao desfazer-se dos títulos. Ao terem pedido dinheiro emprestado ao BCE a 1-1,5% de juros para comprar títulos que estavam a render cerca de 6-8% de juros, durante algum tempo o lucro obtido compensou em larga escala o dinheiro “perdido” no mercado secundário. O problema é que à medida que a crise da divida se aprofunda é mais complicado vender esses títulos e manter algum lucro já que estes desvalorizam-se cada vez mais.
Quando em agosto os títulos gregos atingiram um máximo de desvalorização no mercado secundário, levando também ao aumento dos juros das dividas italiana e espanhola no mercado primário, o BCE que tinha suspendido a compra de títulos de dívida em março deste ano, teve que intervir comprando milhares de títulos a um preço superior ao que estava a ser negociado, parando assim a avalanche de pânico nos mercados.
Em meados de setembro o primeiro-ministro grego anunciou que a Grécia só tinha dinheiro até ao fim do mês e começou-se a falar em toda a imprensa da necessidade de uma reestruturação da divida grega e da possibilidade de Espanha e Itália terem que pedir ajuda. As ações dos bancos europeus despencaram, em particular dos bancos mais expostos às dividas dos países da periferia. O primeiro banco a cair foi o Dexia e um possível cenário Lehman Brothers renasceu no horizonte da economia mundial.
Banco Dexia: um caso exemplar
O caso do banco Dexia mostra bem para quem trabalham os governantes da união europeia. Em Novembro de 2008 este banco franco-belga recebeu uma injeção de capital público de 6000 milhões de euros, garantias no valor de 150 000 milhões e 13 000 milhões em ajudas para sanear ativos tóxicos. Assim este banco, presidido por Pierre Mariani, ex-acessor de Nicolas Sarkozy, pôde começar a pedir dinheiro emprestado ao BCE a juros de 1-1,5% para depois comprar divida grega com juros de cerca de 8%. Um ótimo negócio. O problema começou a surgir quando se tornou mais do que óbvio que a Grécia não teria condições para pagar o próximo prazo de vencimento de pagamento de divida.
O Dexia detém cerca de 20,9 milhões de dívida grega, italiana e de outros países em dificuldades. No total a soma de ativos tóxicos é de cerca de 70 milhões de euros. Nicolas Sarkozy correu prontamente em auxilio do seu ex-assessor: as instituições públicas “Caisse des Dépôts” e Banca Postal serão as principais salvadoras do Dexia.
O grande problema é que não é só o banco Dexia em perigo pela exposição à divida dos chamados PIGS mas também gigantes financeiros como o Société Générale, o Crédit Agricole, BNP Parisbás ou o Commerzbank.
O cenário é apocalíptico. Prevendo-se que Grécia só vai conseguir pagar 30% da sua dívida e se fixar um mínimo de 8% de capital seguro obrigatório para os bancos, a banca europeia tem 124 000 milhões de euros em falta. E se a isto juntarmos um possível pedido de ajuda da Itália ou Espanha, o fundo de resgate europeu aprovado no final de Julho vai ficar muito aquém da demanda.
Crise Económica, Crise Política
Uma boa parte da burguesia mundial está com os cabelos em pé perante a aparente passividade dos governantes europeus face à crise do euro.
Existe algum consenso entre os economistas burgueses acerca de uma solução para a crise da zona euro: perante a inevitabilidade de um default grego há que criar um “muro de defesa” em torno de Itália e Espanha, economicamente viáveis mas com falta de liquidez, e recapitalizar os bancos da zona euro. Ou seja, é necessário fornecer milhares de milhões de euros em dinheiro vivo aos bancos e aos Estados em dificuldades (Itália e Espanha). Mas esta recapitalização necessita de uma quantidade de capital que não permite que seja feita a nível nacional tal como foi feita em 2008.
Fonte: Jornal Opinião Socialista