Fora as garras imperialistas da Líbia

06/08/2011 16:16

Por León Pisón Vargas.
Está em curso uma intervenção imperialista na Líbia, autorizada pela ONU, sob o pretexto cínico de proteção humanitária à população massacrada por Kadafi. Desde 19 de março, Estados Unidos, França e Inglaterra, apoiados por Canadá, Itália e Espanha, realizam bombardeios “humanitários” sobre a Líbia. No mesmo momento, outras ditaduras árabes amigas do imperialismo reprimem impunemente os seus cidadãos que lutam pacificamente por liberdades. O Iêmen massacra manifestações pacíficas; a Arábia Saudita invade o Bahrein para reprimir protestos democráticos; os Estados Unidos bombardeiam diariamente civis afegãos e paquistaneses e ordena ao governo títere do Iraque a repressão sangrenta às massivas manifestações populares contra a ocupação do país; e Israel massacra há décadas o povo palestino. Agora, esses mesmos carniceiros imperialistas vestem a fantasia “humanitária” para cravar as suas garras sobre o povo líbio. Pretextam proteger os civis contra os massacres do seu amigo ditador sanguinário pró-imperialista de ontem, caído em desgraça hoje.

Para os marxistas, a derrubada de Kadafi compete exclusivamente aos trabalhadores líbios e árabes e não ao imperialismo, do qual somente podemos esperar maior escravização dos povos e saque às suas riquezas. Por trás da máscara humanitária, o imperialismo busca o domínio direto do petróleo líbio, sem intermediação, única razão da atual intervenção colonialista, que pretende colocar em Trípoli outro ditador igual ou pior que Kadafi. O imperialismo é o inimigo principal dos povos, não porque Obama, Sarkozi ou Cameron sejam “moralmente piores”, mas porque são infinitamente mais poderosos.

É preciso criar as condições para a derrubada de Kadafi pelos trabalhadores: criar um partido revolucionário e uma organização de massas genuinamente popular, coisas que hoje não existem. Por isso, no momento, sem essas condições, é impossível a derrubada revolucionária de Kadafi, também porque, diante da agressão imperialista, a prioridade é a sua derrota. A atual oposição líbia é dominada integralmente por ex-ministros do governo ou agentes diretos da CIA, há muito tempo organizados militarmente no Egito. Os alardeados Conselhos Populares são organismos tradicionais das tribos líbias, dominados pela sua elite burguesa. A vitória da oposição significaria a continuidade da dominação imperialista. Neste momento de bombardeio, a primeira tarefa dos trabalhadores líbios, árabes e do resto do mundo é a defesa da Líbia, a expulsão do imperialismo. O proletariado apóia os países agredidos pelo imperialismo com os seus próprios métodos: greves, manifestações, boicote, denúncia e participação militar se houver condições.

A política revolucionária deve ser absolutamente independente da burguesia líbia – seja governista ou de oposição – e do imperialismo. Nenhum apoio político deve ser dado a eles. Isso significa não embelezá-los, como faz a esquerda, que mascara o papel da oposição ou de Kadafi. Uma parte da esquerda “trotskista” apóia incondicionalmente a oposição, em nome da mais ampla unidade, inclusive com o imperialismo, para a derrubada da ditadura. Para tanto, encobre ou minimiza o papel pró-imperialista desta. Exigem para ela, homens e armas dos governos burgueses. Vejamos: “Para acabar com Kadafi, os líbios podem e devem contar com a ajuda de todo o mundo árabe, (...) Agora é necessária a insurreição, além de alimentos e medicamentos, e também armas e munições para que se organizem milícias armadas árabes, desde o Egito e a Tunísia, para combater junto a seus irmãos líbios” (LIT-PSTU); “Os governos da Liga Árabe, reunidos no Cairo, (...) resolveram reclamar uma zona de exclusão aérea da ONU, adequando-se à política criminosa de intervenção imperialista, em vez de resolver eles mesmos fazer a exclusão aérea e dar apoio militar aos rebeldes” (UIT). Isso é uma vergonha, uma política pró-imperialista! Como se os governos do Egito, da Tunísia e a própria Liga Árabe não fossem braços do imperialismo e a sua intervenção não fosse equivalente a ele próprio.

E existe a esquerda bolivariana, sandinista, castrista e filo-estalinista em geral, inclusive a LBI, que apóiam Kadafi. Mascaram o papel do ditador como agente do imperialismo nos últimos tempos. Para defender a Líbia da agressão imperialista não é preciso chamar Kadafi de “nacionalista”, nem defender as supostas conquistas ainda remanescentes, como faz a LBI. Defender uma nação agredida pelo imperialismo é um dever incondicional, assim como defendemos o Iraque, apesar de Saddam Hussein nunca ter sido anti-imperialista.

Não existe política de independência de classe com relação à Líbia entre a maioria da esquerda. As duas posições citadas, aparentemente opostas, são variantes da política burguesa. Da mesma forma, ninguém faz uma análise conjuntural honesta sobre os interesses em jogo. Todos dizem meias verdades, portanto, todos mentem. A esquerda, como a LIT, UIT, MR, fala a verdade sobre Kadafi, mas omite sobre o caráter pró-imperialista da oposição. O MR se supera na impostura ao dizer na sua declaração conjunta com a Convergência Socialista argentina que: “O processo revolucionário que estalou na Líbia tem, objetivamente, um caráter socialista”. A esquerda filo-castrista – incluída a LBI – mostra o verdadeiro caráter da oposição, mas embeleza Kadafi. A primeira diz que a intervenção está a favor de Kadafi e a segunda o oposto. Ninguém diz que o imperialismo trabalha com diversas alternativas. O objetivo principal é o controle direto, colonial, do petróleo líbio e a transformação da Líbia numa base militar imperialista. A sua hipótese preferida é colocar em Trípoli um preposto direto, como no Iraque, mas pode se contentar provisoriamente com a divisão da Líbia e o controle da zona petrolífera. A busca por esse objetivo não exclui um jogo entre os dois contendores, Kadafi e a oposição. O imperialismo – “surfando” nas rebeliões do mundo árabe – ajudou a criar a oposição, mas não suspendeu o financiamento a Kadafi e permitiu que este a encurralasse militarmente. O enfraquecimento dos dois lados favorece o seu papel de árbitro. Evidentemente, os bombardeios significam uma opção contra Kadafi.

A luta contra o imperialismo é uma generalização. Não existe um único imperialismo. Estados Unidos, França, Inglaterra, Canadá, Itália e Espanha fizeram um acordo pela partilha do petróleo líbio. Aparentemente a Alemanha não quis participar. As semi-colônias Rússia e China, que têm interesses na Líbia, se abstiveram no Conselho de Segurança. Em certo sentido, capitularam aos países da coalizão, mas demonstraram que têm interesses diferentes. Por exemplo, a Rússia se absteve, para depois denunciar que está havendo na Líbia uma “cruzada” colonial. A realidade é muito mais complexa que o reducionismo oportunista vigente na esquerda. É preciso levantar uma política de independência de classe, que, neste momento, passa, em primeiro lugar, pela expulsão do imperialismo e pelo apoio à Líbia com os métodos do proletariado. 

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