Educação a serviço do povo ou dos monopólios?

12/02/2011 14:02

Por Felipe Campos*.

A crise do ENEM no final do ano passado, originada pelo erro da impressão das provas, prejudicou milhares de estudantes em várias cidades e capitais do país. Houve mobilizações em SP, MG, RJ, PR, RE, entre outros lugares, e na mídia se abriu um debate que colocava em cheque não só a legitimação da Prova, como também do Ministro da Educação Fernando Haddad. O PT alegou um problema técnico no marco da propaganda do ENEM como uma avaliação mais democrática, apresentado como um passo para o fim do vestibular. Dilma decidiu manter Haddad como ministro. Entretanto, tal decisão gera contradições que vem se acumulando.

Apesar de que boa parte da população ter ilusões de ascensão social porque seus filhos tiveram acesso à universidade, isto se dá fundamentalmente nas privadas e no marco de um crescimento econômico que não pode ser duradouro no marco da crise internacional. Além disso, o governo Lula passou longe de melhorar o ensino público infantil, fundamental e médio e, apesar de um aumento no número de vagas nas universidades federais, é irrisório para atender aos interesses da população. É por isso que, mesmo num final de mandato de Lula com aprovação recorde de 87%, a educação pública aparece em 2º lugar (com 19,7%) nos principais problemas apontados pela população.

No início da 2ª quinzena de janeiro, mais um problema, agora com o site do SISU- Sistema de Seleção Unificado, que seleciona estudantes para vagas na universidade pública. Praticamente inacessível fez com que milhares de jovens tivessem dificuldades e não conseguissem se candidatar as vagas oferecidas. Mais uma vez o alegado por parte do MEC foram “problemas técnicos”.

Por trás dos “problemas técnicos”, existe um estrutural.

Haddad declarou: “Ou bem aproveitamos para aprender com as eventuais falhas sem abdicar de um processo transformador ou essa evolução não vai se dar por um temor que é justificável, mas superável.”

O que o governo quer esconder é que o “processo transformador” está dentro de uma lógica a qual foram mais de 3,2 milhões de jovens que concorreram a apenas 83.215 vagas no Ensino Superior Público. Uma proporção de aproximadamente 40 estudantes por vaga. O Novo ENEM, portanto, passa longe de ser o fim do vestibular, pelo contrário é um sintoma da incapacidade do PT e de toda a burguesia brasileira, a responder uma questão democrática como o acesso a universidade pública e gratuita. Lula se apresenta como uma grande ruptura em relação à FHC, em particular no campo da educação, mas a verdade é que ele manteve o essencial da política tucana: privilegiou os grandes monopólios da educação privada, que seguiram crescendo vertiginosamente no governo Lula e recebendo subsídios via Prouni, sendo hoje responsáveis por 75% das vagas do Ensino Superior. O governo propagandeia muito a ampliação de 101 a 180 mil vagas nas federais desde 2003 (sem verbas necessárias, e por isso significou precarização da infra-estrutura e da qualidade de ensino) mas não pode esconder que no governo da “revolução na educação”, não somente esse número é irrisório, mas as Universidades Federais apresentaram uma queda na proporção de vagas nas universidades em geral de 30% a 25% de 2003 para cá. É por isso que dizemos que o aumento de 50% de universitários, se dá no mesmo modelo de legitimação da estrutura privada, atendendo aos interesses dos monopólios. E a universidade pública de qualidade segue sendo para muito poucos.

PNE- Plano Nacional de Educação: Mesmos se as metas da burguesia fossem cumpridas, a educação ainda seria um atraso!

Podemos dizer que a educação seguiu o curso político e ideológico do Lulismo, da evolução lenta e gradual. Entretanto, o que se apresenta como atendimento ao anseio democrático da população, é na verdade o atendimento a uma necessidade da burguesia de incrementar seus lucros e fortalecer sua competitividade no mercado externo, as metas burguesas não cumpridas no PNE- Plano Nacional de Educação 2001/2010, revelam uma crise de projeto que em si colocam em cheque o discurso do momento de “Brasil Potência”. Como vemos na análise do jornalista Marcelo Leite, que expressa a educação como um elo débil do projeto de “Brasil Potência” :

“O ensino superior no país avançou, mas devagar. O ensino técnico, menos ainda. Grosso modo, pode-se dizer que, mesmo nos níveis inferiores, apenas começaram a ser resolvidos os problemas de acesso à educação. Permanecem sem abordagem comprovadamente eficaz os de fluxo (repetência) e qualidade (conteúdo). Como resultado, o país está ainda longe de um sistema de ensino capaz de sustentar o surto de inovação necessário para posicionar-se no mercado mundial como algo mais que um grande exportador de commodities.”

Um exame das metas do PNE desmascara a propaganda lulista. Por exemplo, o último PNE apontava a erradicação do analfabetismo, mas entre 2001 e 2008 a taxa de analfabetos caiu apenas de 13% para 10%, o que significa ainda mais de 14 milhões de analfabetos. No ensino fundamental, a taxa das crianças de 07 a 14 anos que estavam fora da escola caiu apenas 1,1%, estando em 2008 em 2,4% o que representa mais de 680 mil crianças sem estudar (sendo 450 mil, negras, e que vivem na região do Norte e Nordeste). A reprovação aumentou de 11% para 12,5% no Ensino Fundamental e Médio, num patamar superior a países da América Latina e do Caribe que tem um índice de 4%. Para não falar do plano de carreira dos professores, que o absurdo piso de R$1024,00 por 40 horas trabalhadas indicado para 2001, só foi ser implementado de fato em 2009. Quando chegamos no ensino superior a comparação com o passado evidenciam o atraso. Atualmente 11% da população possuem diploma universitário, contra uma média de 28% em países com o mesmo PIB brasileiro, e apesar do aumento de 8,8% para quase 15% dos jovens até 24 anos matriculados em universidade, não chegou nem na metade da meta dos 30% estipulada pelo PNE.

A mercantilização da educação é uma estratégia do Imperialismo!

Desde a elaboração do Plano Bolonha,  que introduziu diretrizes do Banco Mundial para as universidades, a estratégia do Imperialismo Norte-Americano e Europeu tem sido a ampliação de vagas para os trabalhadores e a população pobre de um ensino técnico e superior precário, com uma produção de conhecimento voltada a formação de mão de obra para o mercado, e a manutenção de poucos centros de excelência de caráter elitista mais restrito ao desenvolvimento tecnológico e a renovação de quadros.

O Plano Bolonha,  que sofreu resistência com manifestações massivas em várias cidades européias, vem sendo fragmentado e chegando lentamente a outros países.

Mas onde se vê, cabalmente, o peso do imperialismo nas definições da política do governo Lula (que será a mesma de Dilma) é no controle dos monopólios, em grande parte de capital estrangeiro, sobre a educação do país como se expressa nos investimentos das ações em grupos como o Anhanguera e Estácio de Sá. Assim, o tão aclamado “Brasil potência” está atrás de países como Argentina, que já acabou com o vestibular, no acesso ao ensino superior.

Para seguir as regras do imperialismo Dilma alinha seu discurso com o debate atual sobre o desenvolvimento educacional na Coréia do Sul. Ao qual se mantém com uma lógica de uma formação de mão de obra precária para o mercado de trabalho, a partir da ampliação e massificação do Ensino Técnico, e não necessariamente pela Universidade, resultando na diminuição de investimento nas pesquisas acadêmicas, principalmente na área humanística.

Diante esse cenário, a defesa da educação pública, gratuita e de qualidade no Brasil, passa por uma luta anti-imperialista contra os monopólios e seus mandos e desmandos para fazer o conhecimento ser voltado aos lucros dos capitalista, e não aos interesses da população.

Só a aliança entre a juventude, os trabalhadores e o povo pobre para conseguir democratizar a educação e colocá-la a serviço dos seus interesses!

É notável a incapacidade dos distintos setores da burguesia brasileira em resolver uma demanda histórica e democrática como a educação. Os atrelamentos econômicos que tal classe possui com o capital internacional e a opção neoliberal de massificar o ensino superior pela legitimação da sua estrutura privada pressupõe um não investimento na educação pública, gratuita e de qualidade.

A única possibilidade de avançarmos nesse sentido é através das lutas e mobilizações, dentro de uma perspectiva concreta de aliança com os trabalhadores e a população pobre que sofrem com a exclusão de um direito elementar: a educação pública, gratuita e de qualidade.

É preciso seguir reivindicando o fim do vestibular, a estatização das universidades particulares (em primeiro lugar, dos 10 principais monopólios) e a ampliação dos investimentos a educação pública, gratuita e de qualidade, através do combate contra as burocracias acadêmicas e os governos, como a única saída concreta para democratizar o conhecimento e colocá-lo a serviço dos trabalhadores e do povo pobre.

*Felipe Campos é militante da LER-QI, organização trotskysta

 

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